A Construção e a Formação Do Território Brasileiro No ano 2000, você deve ter participado de alguma forma das comemorações dos 500 anos de chegada de Cabral ao Brasil. Os meios de comunicação de massa, tanto aqui como em Portugal, discutiam o assunto; entre as muitas atividades, historiadores e outros cientistas sociais foram convidados para inúmeras palestrar e debates; enfim, várias questões surgiram ao se pensar em 500 anos de Brasil. O que comemorar? Foi um descobrimento, um achamento ou invasão? Vale dar aos portugueses o papel de “descobridores” de uma terra que já era habitada por 5milhões de pessoas? Foram os portugueses descobridores ou exploradores? Com base as estas perguntas e outras vamos agora analisar o texto abaixo. Manifesto Brasil:
500 anos de resistência Indígena, Negra e Popular Aproxima-se a data – 22 de abril de
2000 – que nos fará refletir sobre o dia, 500 anos atrás, em que um
grupo armado de portugueses desembarcou nestas terras, com a meta de
anexa-la como território colonial. Aqui
viviam mais de 5milhões de pessoas, pertencentes à cerca de 970
diferentes povos. Eram os legítimos donos destas terras, possuidores de
tudo menos de anticorpos para
as doenças européias, de armas mortais à base de pólvora e
chumbo, nem de impulso de violência, exploração, depredação e
saque. Disto eram portadores privilegiados aquele grupo de homens
maltrapilhos e doentes que desceu a praia de hoje Cabrália, sul da
Bahia, cinco séculos atrás, dizendo que estavam “descobrindo um Novo
Mundo” e que para estas terras trariam seus ideais de civilização,
progresso e evangelização. Naquele
dias foi dado início à expansão do Velho Mundo nestas terras, através
da sua brutalidade letal e organizada, pronta para projetar-se contra
tudo e contra todos que estivessem em seu caminho. Aquele 22 de abril de
1500 foi um dia mítico, matriz de uma história violenta e desumana,
que continua até os nossos dias.
Fonte. http:/www.apg.ufu.br/apgufsc/artigos/500 As origens culturais do povo brasileiro Quando os portugueses chegaram ao Brasil, a terra era ocupada havia muito tempo pelos Potiguara, Pataxó, Terena, Xavantes, Yanomani, Kaingang, Juruna, Timbira. Karajá, Krenak, entre outros. Esses povos produziam e organizavam seus espaços, à medida que transformavam a natureza com o seu trabalho, deixando marcas de sua cultura e suas concepções, de mundo de um grupo social está expressa não só na forma de ele ocupar o espaço, mas também em como o grupo utiliza os recursos e transforma a natureza pelo seu trabalho. Os habitantes de território antes da chegada dos portugueses utilizavam a terra coletivamente, para a retirada do sustento, sobrevivência, sem preocupação com a acumulação a exploração para fins que não fossem o de uso. Várias comunidades indígenas mantêm esses hábitos, conforme podemos notar no texto extraído de Aracy Lopes da Silva e Luís D. Benzi Grupioni, do livro Sociedades Indígenas, 1995 (p. 453). [...]
as sociedades indígenas convivem com o ambiente sem depreda-lo
irreversivelmente. Vejamos como isso ocorre. Em
relação ao território em que vivem, as sociedades indígenas não têm
a noção de propriedade privada da terra. Lembramos que, na nossa
sociedade, a terra é considerada uma mercadoria e como tal pertence a
quem possa pagar por ela. Pode alguém ser proprietário de um terreno
sem nunca telo visto, assim como pode alguém residir e trabalhar sem
ter sua propriedade e, assim, sem poder contar com o produto integral de
seu trabalho. Os povos indígenas reconhecem a “posse” de um território
a partir do uso que fazem dele. Essa posse é coletiva na medida em que
todas as famílias podem utilizar os recursos existentes neste território,
como a água dos rios, lagos, cachoeiras, os peixes, os animais, as aves
e os vegetais. Não faz parte da idéia indígena de posse as preocupações
em estabelecer limites e fronteiras intransponíveis, como fazem com
nossas cercas e muralhas. A história
da formação territorial do Brasil, bem como o processo de colonização,
firmou uma característica importante da sociedade – a diversidade
cultural, base da formação do povo brasileiro. A característica mais
evidente da cultura brasileira é a heterogeneidade,
decorrente da diversidade de origem das manifestações culturais
brasileiras, européia, africana e indígena. Inicialmente o colonizador europeu contou com a mão-de-obra e os conhecimentos indígenas, mais tarde aproveitou-se da força de trabalho e dos saberes dos negros africanos. A partir disso, índios e negros tiveram de resistir e reelaborar suas culturas para sobreviver à dominação imposta pelo conquistador europeu, Esse confronto entre culturas tão diferentes gerou a heterogeneidade. Ao analisar cada grupo isoladamente, encontram-se resistências especificas e alguns costumes preservados. Porém, é evidente que o português, na situação de povo conquistador, favorecia a preservação dos próprios valores culturais, enquanto o africano como povo escravizado precisou lutar intensivamente para manter sua identidade cultural. De 1.532 a 1.630, os portugueses ainda estava muito próximo dos hábitos de sua terra natal, principalmente no que diz respeito à alimentação. O vinho, a farinha de trigo, o azeite, a azeitona, o vinagre, o queijo e outros produtos de origem européia não deixaram de ser consumidos no Brasil, mesmo pelos mais nobres, que na época eram os paulistas. Os elementos culturais trazidos pelos europeus e africanos somaram-se aos aspectos indígenas, sendo então reelaborados e originando a cultura brasileira. A formação da cultura brasileira está relacionada ao processo de organização do país como nação, isto é, um conjunto de pessoas que compartilham um mesmo processo histórico, que determina uma forma de viver e de organizar as paisagens. Essa identidade cultural possibilita uma consciência nacional, ou seja, o sentimento de fazer parte de um país, além de dar unidade a ele, permitindo a manutenção das atuais fronteiras. A variedade cultural brasileira tem sofrido os efeitos da homogeneização promovida pela forte influência do modo de vida da sociedade moderna, inspirada nos valores e nas tradições européia e norte-americana. Esses novos valores entram nas casas através dos meios de comunicação de massa (televisão, internet, rádio, revista, jornais), da industria cultural e do forte apelo consumista. Culturas
indígenas no Brasil As terras indígenas estão distribuídas em todo território nacional, com destaque para a região da Amazônia legal, onde encontramos um número maior de reservas indígenas, abrigando atualmente uma população de 300 mil habitantes. Observe no quadro abaixo as etnias mais numerosas. Tribo
números
localidade Guarani 41.000 Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito. Santo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Kaingang 22.000 São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ticuna 21.000 Amazonas Terena 19.000 Mato Grosso do Sul e São Paulo Guajajara 13.000 Maranhão Xavante 10.000 Mato Grosso Yanimami 9.500 Roraima e Amazonas Macuxi 9.000 Roraima Potiguara 9.000 Paraíba Xucum 5.200 Pernambuco Fonte almanaque Abril/2000 Entre os grupos indígenas que foram dizimados pelas armas e doenças para as quais não possuíam imunidade estão o Tupinambá, o Caeté e os Goitaká. Os que não morriam nem eram escravizados migravam para outras áreas, onde tentavam reconstruir suas sociedades. Muitos dos povos indígenas que hoje habitam terras da Amazônia são remanescente dessas populações migrantes. A trajetória da colonização do território brasileiro consegue explicar por que os grupos indígenas acabaram se concentrando na Amazônia Legal. Os conquistadores ocuparam primeiramente o litoral e depois seguiram para o interior. À medida que a agropecuária e o extrativismo mineral iam incorporando novos espaços, os povos indígenas perdiam suas terras de caça, pesca, as áreas das aldeias e cemitérios, sendo expulsos desses territórios ou simplesmente exterminados. Desde os primeiros contatos entre brancos e nativos, a história das relações entre essas duas sociedades foi marcada por uma série de equívocos. A começar pelo nome genérico com o qual os espanhóis e portugueses batizaram os povos das novas terras: Índios. Acreditando terem desembarcado nas índias, os europeus passaram a chamar os nativos da América de índios, não importando as diferenças entre os Tupiniquim e os Hariri, entre os Caeté e os Xavantes. Como os primeiros contatos dos portugueses com os nativos foi com o povo do tronco lingüístico Tupi, cuja maioria vivia próximo ao litoral, os conquistadores passaram a adotar determinados traços dessa cultura para interpretar a nova realidade com a qual se defrontavam. Nos dias de hoje, os índios unem-se a fim de reivindicar os direitos de autodeterminação do diferentes povos, de retomada das terras que historicamente lhes pertencem e de preservação de suas culturas e do ambiente onde vivem. É por isso que muitos grupos indígenas acreditam fazer de uma outra nação: um Yanomami, por exemplo, reconhece as fronteiras do Brasil e as políticas que aqui se desenvolvem, mas tenta a todo custo garantir o seu modo de vida, ou seja, antes de ser brasileiro, ele é um Yanomami. Defesa
dos Interesses Indígenas Organizados em associações, como a União das Nações Indígenas UNI, Criada em 1980, ou através de entidades que igualmente defendem seus interesses, como o Conselho Indigenista Missionário CIMI, fundado em 1972, os novos indígenas cada vez mais vêm-se conscientizando dos limites e ambigüidades de organismos estatais, como a Fundação Nacional do Índio FUNAI, que os representam. A FUNAI foi criada no final da década de 1960 para substituir o Serviço de Proteção ao Índios SPI, o primeiro órgão do país que tinha como objetivo solucionar os problemas das comunidades nativas. No entanto, nenhum dos dois órgãos consegui resultados que refletissem os reais interesses dos índios. Por esse motivo, esses povos passaram a questionar a representatividade de organizações criadas por decretos. Apesar das políticas oficiais dos diferentes governos brasileiros, a situação dos índios não mudou. Eles continuam sendo excluídos e sem os seus direitos mais elementares garantidos, como o de sobrevivência física e cultural, o de autonomia para governar os seus próprios destinos e o de manter ou recuperar suas terras. Cultura
afro-brasileira e a questão da negritude Não como dissociar as origens e o desenvolvimento das culturas afro-brasileiras do regime escravocrata que imperou no Brasil durante mais de três séculos. O africano era tratado como mercadoria, um objeto de interesse das pessoas que os capturavam e os vendiam e também daqueles que os utilizavam como mão-de-obra em suas plantações. Com muita dificuldade, os negros africanos trazidos como escravos procuraram manter seus valores culturais. Embora fossem forçados a aceitar a submissão, ofereceram resistência para preservar suas tradições culturais. No texto abaixo pode-se perceber as formas que encontraram para fazer isso. “ Para enfrentar os senhores e seus agentes, os cativos tiveram que agir com malícia e sempre tratando de dissimular sua verdadeira intenção. A capoeira, uma luta corporal criada pelos escravos, é um bom exemplo disso. [...] A mesma estratégia de dissimulação orientou os africanos para poderem continuar adorando seus deuses no Brasil. Nos calundus dos século XVIII e nas casas de candomblé do século XIX, percebia-se uma íntima convivência de elementos africanos e cristãos. No entanto, a intolerância sempre foi grande, e os negros, a fim de cultuarem seus orixás, acabaram relacionando-os aos santos da Igreja católica. Para que seus batuques pudessem se realizar, os africanos aproveitavam as ocasiões em que havia as festas religiosas das irmandades negras, como as de São Benedito e de Nossa Senhora do Rosário. Nessas festas, os atabaques batiam para os homens e para os deuses”. Texto extraído de Leticia Vidor Souza Reis Ensaios sobre a cultura e a escravidão no
Brasil São Paulo,Eusp/Estação Ciência, 1996, p.
34-35 A resistência negra assumiu múltiplas formas: cativos se suicidavam, num último e desesperado gesto de recusa à escravidão; escravas se negavam a gerar filhos, dado que estes estavam condenados, desde o nascimento, a não serem donos de si próprios, além das rebeliões e fugas cotidianas do Brasil escravocrata. Muitos dos que lutavam pela liberdade refugiavam-se no quilombos. A partir do surgimento dessas comunidades, a possibilidade de viver espalhou-se pelo Brasil, incentivando as fugas e tornando os quilombos símbolos da resistência de um povo. O mais conhecido de todos os quilombos foi o de Palmares, uma sociedade multirracial que durou de 1957 a 1664 e chegou a reunir, em seu apogeu, aproximadamente 30 mil pessoas espalhadas por nove povoados ou mocambos, Macaco era o mais importante, sendo considerado sua capital. O território de Palmares tinha aproximadamente 150 Km de comprimento por 50 Km de largura e englobava terras dos atuais estados de Alagoas e Pernambuco. Seus habitantes cultivavam vários produtos entre eles podemos citar. · feijão, milho, batata, mandioca, fumo e cana-de-açúcar; · criavam porcos e galinhas; · praticavam a pesca, e a caça; · coleta de frutos como o coco, banana, jaca e graviola; Não foram apenas os quilombos que representavam ameaças, as manifestações culturais negras, como a capoeira de Angola, praticada pelos escravos de origem banto, revestiam-se de caráter libertário, mantendo, assim, um potencial revolucionário que, desde cedo, foi percebido pelo colonizador como uma séria ameaça ao regime escravocrata. Daí as proibições e as perseguições aos que as praticavam. Mesmo após a abolição, muitas das expressões culturais afro-brasileiras continuaram sendo perseguidas e reprimidas, como o candomblé, a umbanda e as demais religiões de raízes africanas. Os terreiros e centros religiosos afro-brasileiros eram, com muita freqüência, invadidos pela polícia, que os fechavam em nome da lei e da ordem. Mesmo quando houve a liberação de tais práticas rituais, os terreiros e os cultos ficaram atrelados à autorização do Estado que, assim, mantinha um relativo controlo sobre as instituições religiosas dos ex-escravos. A música negra, como o samba no Brasil ou o blues nos Estados Unidos, sempre refletiu a condição social do povo negro. Para os negros, preservar sua cultura significou uma luta diária pela sobrevivência. Embora ameaçados pelo cativeiro, proibidos de praticar os seus ritos, vítimas de violência e de separação física entre pessoas do mesmo grupo familiar, eles continuaram lutando pela manutenção de seus valores culturais, em alguns momentos até reelaborando esses valores para não deixá-los perdidos para sempre. As
migrações no Brasil O Brasil recebeu um contigente muito grande de pessoas de outros países, os imigrantes. Os hábitos e os costumes, dentre outros elementos da cultura desses grupos, podem ser percebidos de diversas maneiras, entre elas podemos destacar: · a sua religião · a sua moradia · a sua alimentação · o modo de se vestir entre outros Os imigrantes foram atraídos para o Brasil para trabalhar nas lavouras, nas fábricas ou como comerciantes e artesão. A forma como eles viviam veio somar-se à dos povos que já se encontravam no Brasil, resultando em uma identidade nacional com características multiculturais. Blumenau, por exemplo, que fica no estado de Santa Catarina, é uma cidade onde as marcas da cultura alemã estão presentes em cada esquina, criando um cenário urbano característico. A contribuição cultural dos imigrantes também é perceptível em outros estados brasileiros. Em São Paulo, a chegada de italianos e depois de japoneses e de holandeses impôs uma dinâmica cultural facilmente identificável em alguns municípios. O número de imigrantes no Brasil é calculado em 5 milhões de pessoas, 80% dessa população chegou ao país a partir de 1900. Acompanhe, na tabela, a distribuição desse contigente imigratório. Período
-
Portugueses - Italianos – Espanhóis – Japoneses - Alemães
- Total 1851-1885 237 128 17 - 59 441 1886-1900 278 911 187 - 23 1.398 1901-1915 462 323 258 14 39 1.096 1916-1930 365 128 118 85 81 777 1931-1945 105 19 10 88 25 247 1946-1960 285 110 104 42 23 564 Total
1.732
1.619
694
229
250
4.523 Em milhares
Fonte Darcy Ribeiro. O povo brasileiro a
formação e o sentido do Brasil. São Paulo, companhia das letras, 1995 Em geral, o fenômeno da imigração ocorre porque, no local de origem, esgotaram-se as condições e as perspectivas de melhorias de vida das pessoas, fazendo com que elas mudem de lugar. Essa procura por melhores condições em outros lugares demostra que as migrações internas no Brasil são, na realidade, um êxodo forçado. Apesar de, algumas vezes, a migração contribuir para a concentração da propriedade de terra nas mãos de poucas pessoas, há camponeses que tentam manter suas terras. Há casos, por exemplo, em que alguns membros da família migram para outras áreas rurais ou para a cidade, a fim de arranjarem um trabalho que lhes possibilite ganhos suficientes para ajudar os que ficaram. Muitos desses migrantes acabam retornando aos lugares de origem, alguns instalam-se definitivamente no novo lugar e daí partem para outros cada vez mais distantes. Há ainda aqueles que acompanham o ritmo sazonal do trabalho agrícola, mudando constantemente durante o ano. Abaixo vamos ver um pequeno texto das principais imigrações ocorridas no Brasil, estes textos foram extraídos de Maria Silvia C. Beozzo Bassanezi. “Imigrações internacionais no Brasil: um panorama histórico”. Emigração e imigração internacionais no Brasil contemporâneo. Neide Patarra (org).2. ed. São Paulo, FNUAP, 1996 A
imigração dos portugueses A corrente migratória portuguesa, por exemplo, diferenciou-se, no Brasil, das demais correntes estrangeiras, por Ter compartilhado, por três séculos, uma história e por falar a mesma língua da terra [...] Os portugueses tenderam menos aos trabalhos agricolas do que os italianos, espanhóis, japoneses e alemães. Bibliografia. Almanaque Abril/2000 http:/www.apg.ufu.br/apgufsc/artigos/500 Texto extraído de Leticia Vidor Souza Reis Ensaios sobre a cultura e a escravidão no
Brasil São Paulo,Eusp/Estação Ciência, 1996, p.
34-35 Fonte Darcy Ribeiro. O povo brasileiro a
formação e o sentido do Brasil. São Paulo, companhia das letras, 1995 Azevedo, Fernando, Princípios de
sociologia, 7, ed. São Paulo: Melhoramentos Prado, Paulo. 8. Ed Retrato do Brasil, São Paulo: Companhia das Letras, 1997 |